O mês de junho, tradicionalmente associado ao Dia dos Namorados, é um período propício não apenas para celebrações afetivas, mas também para reflexões sobre os vínculos estabelecidos nos relacionamentos amorosos. Em especial, o Direito de Família se debruça sobre uma questão que, embora frequente na prática forense, ainda gera muitas dúvidas entre os casais: a distinção entre namoro qualificado e união estável.
A delimitação clara entre essas duas formas de relacionamento é fundamental, pois envolve consequências jurídicas significativas, especialmente no que se refere aos direitos patrimoniais, sucessórios e alimentares.
1. Conceito de União Estável
A união estável é reconhecida pela Constituição Federal de 1988 (art. 226, §3º) como entidade familiar, equiparada, em muitos aspectos, ao casamento. De acordo com o ordenamento jurídico brasileiro, para sua configuração são necessários os seguintes elementos:
- Convivência pública, contínua e duradoura;
- Estabilidade na relação;
- Intenção manifesta de constituir família.
Importante destacar que não há exigência de formalização para o reconhecimento da união estável. Basta que estejam presentes os elementos fáticos e subjetivos que a caracterizam. Em razão disso, é comum que casais se surpreendam ao serem considerados unidos estavelmente pela Justiça, mesmo sem terem formalizado essa intenção.
2. O Namoro Qualificado e Seus Limites Jurídicos
O namoro qualificado é uma relação afetiva marcada pela constância, pela convivência frequente e pela aparência de estabilidade. No entanto, não está presente o animus de constituir família, elemento essencial para a caracterização da união estável.
Trata-se, portanto, de uma relação sem efeitos jurídicos familiares diretos, ainda que envolva demonstrações públicas de afeto, longos períodos de convivência e, em alguns casos, até coabitação esporádica. O ponto central da distinção reside na ausência de um projeto comum de vida familiar.
3. A Zona de Risco: Quando o Namoro é Interpretado como União Estável
A jurisprudência brasileira tem reconhecido, em diversos casos, a existência de união estável com base em elementos materiais e afetivos — mesmo contra a alegação de um dos envolvidos de que se tratava apenas de um namoro. Alguns fatores que contribuem para esse reconhecimento judicial incluem:
- Coabitação duradoura;
- Compartilhamento de despesas e contas bancárias;
- Aquisição conjunta de bens;
- Inclusão de um dos parceiros como dependente em plano de saúde ou previdência;
- Existência de filhos em comum ou planejamento familiar.
Essa realidade revela que o reconhecimento da união estável pode ocorrer independentemente da vontade formal das partes, desde que os elementos probatórios sejam suficientes para evidenciar a intenção de constituir família.
4. O Contrato de Namoro como Instrumento de Prevenção Jurídica
Diante da possibilidade de confusão entre namoro qualificado e união estável, surge o Contrato de Namoro como instrumento jurídico preventivo. Trata-se de um pacto firmado entre as partes, com a finalidade de declarar expressamente que a relação mantida não possui caráter de entidade familiar.
Embora não impeça que, no futuro, a relação evolua para uma união estável, o contrato tem valor probatório e pode reduzir o risco de reconhecimento judicial indevido da união estável, especialmente em caso de litígios relacionados à partilha de bens ou direitos sucessórios.
Para maior segurança jurídica, recomenda-se que esse contrato seja elaborado com a orientação de uma advogada especializada e lavrado por escritura pública.
5. Considerações Finais
A diferenciação entre namoro qualificado e união estável é de extrema relevância, sobretudo em um contexto no qual as formas de constituição de família se diversificam. O Direito de Família, como ramo dinâmico e sensível às transformações sociais, exige constante atualização e compreensão das nuances presentes nos vínculos afetivos contemporâneos.
Nesse cenário, cabe aos profissionais da área orientar seus clientes quanto à importância da clareza jurídica nas relações, promovendo não apenas segurança patrimonial, mas também o respeito à autonomia das partes envolvidas.
Dra. Thainá Batista